A Ciência no emaranhado dos jogos de poder: o lugar da Saúde Coletiva no contexto da pandemia da Covid-19
Publicado pelo Observatório de Análise Política em Saúde, por Carmen Teixeira*
Carlos Matus, em seu último livro, intitulado “Teoria do jogo social” (Matus, 2005), publicado postumamente, considera o sistema social como um grande jogo, complexo, nebuloso e de final aberto, composto por vários jogos individuais, simultâneos, que coexistem no mesmo tempo e no mesmo espaço, indivisivelmente entrelaçados.
Buscando identificar e analisar os diversos jogos, propõe a existência de 9 jogos de poder: o jogo político, o econômico, o jogo da vida cotidiana, o pessoal, o comunicacional, o macro organizacional, o jogo dos valores, o jogo das ciências e, por fim, o jogo da natureza.
Segundo o autor, “cada jogo tem uma lógica, uma função e critérios particulares de validação. No jogo político impera a lógica do poder e da força, ao passo que no jogo das ciências só é válida a lógica da argumentação e da verificação empírica. No jogo econômico esta argumentação não tem peso, e é substituída pela lógica do mercado, a qual, é inaplicável ao jogo dos valores, onde opera a lógica da aceitabilidade. O jogo da natureza tem sua própria lógica nas leis naturais, enquanto o jogo pessoal é regido pela lógica dos ganhos e perdas em posições pessoais” (Matus, op. cit. p. 352).
Os critérios de validação também são diferentes. No jogo das ciências, os conhecimentos produzidos e propostas de ação dele derivadas são validadas como verdadeiras ou falsas, ao passo que no jogo político o que conta é a efetividade social, ou seja, a possibilidade de determinada ação gerar acumulação ou perda de poder. No jogo pessoal o que vale é o grau de satisfação individual obtida. Já o jogo da comunicação opera em função da inteligibilidade dos atos de fala, ou seja, da capacidade do emissor, seja uma pessoa, um sujeito coletivo – entidade, associação, partido político – e, no geral, os meios de comunicação de massa – produzirem enunciados compreensíveis, capazes de sensibilizar e induzir comportamentos no receptor, isto é, nas pessoas individualmente e nos grupos sociais, reforçando, justificando ou modificando suas crenças, opiniões, conhecimentos e valores.
Pensando sobre o que estamos vivendo, no momento atual, imersos no emaranhado desses jogos que se reproduzem cotidianamente diante de nossos olhos e ouvidos conectados na caudalosa produção de informações, notícias e debates sobre a pandemia da Covid-19, uma questão especifica me mobilizou a resgatar a contribuição de Matus, qual seja:
Qual o lugar que a produção de conhecimentos científicos no campo da Saúde Coletiva tem ocupado (e pode ocupar) no jogo das ciências que vem sendo jogado acerca da pandemia? A partir desta, outra questão se colocou: como os resultados desse jogo têm afetado, ou não, os demais jogos, especialmente o jogo da comunicação social e o jogo político?
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*Doutora em Saúde Pública, Professora Titular (aposentada) do Instituto de Humanidades, Artes e Ciências da UFBA e docente do PPGSC/ISC -UFBA. Integrante do Núcleo Baiano do Cebes.
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