Pesquisa investiga as condições de trabalho e saúde mental dos profissionais da saúde indígena
Uma nova vertente da pesquisa Condições de Trabalho dos Profissionais de Saúde no contexto da Covid-19 no Brasil está em curso, desta vez, voltada aos profissionais que atuam no cuidado à saúde indígena. A pesquisa faz parte do projeto integrado do CEE-Fiocruz Mundo do trabalho e Saúde, parceria do Centro com a Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (Ensp/Fiocruz), e se realizará por meio de questionário on-line, que está circulando desde 19/4/2023 – quando se celebrou o Dia da(o) Indígena.
Os pesquisadores buscarão gerar dados que auxiliem as entidades profissionais na fundamentação e formulação de propostas de melhoria do Sistema Único de Saúde e no desenvolvimento de ações estratégicas e de políticas públicas, capazes de resultar em melhores condições de trabalho a esses profissionais, aí incluídos os de nível superior (médicos, enfermeiros, assistentes sociais, cirurgiões-dentistas, entre outros) e os de nível médio e técnico (dos técnicos de enfermagem aos barqueiros, que conduzem as ambulanchas). Serão avaliados aspectos como a atuação no dia a dia, o ambiente em que trabalham, o vínculo que mantêm com o Estado, a quem respondem, quem os contrata.
“Nunca tivemos uma pesquisa que tratasse disso. Vamos verificar quem são esses trabalhadores. O vínculo empregatício que mantêm é uma grande incógnita”, observa a pesquisadora Maria Helena Machado, que coordena a investigação, ao lado do pesquisador Swedenberger Barbosa, também secretário executivo do Ministério da Saúde.
A pesquisa sobre os profissionais de saúde indígena chegou a ser iniciada em 2022. No entanto, a equipe de pesquisadores enfrentou dificuldades de várias ordens para levar à frente o trabalho, desde problemas estruturais, como localização geográfica desses trabalhadores, dificuldade de acesso à internet nas aldeias, até, principalmente, os entraves encontrados dentro do próprio governo federal, na Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai). “Fomos barrados pelas estruturas de atenção à saúde indígena, dificultaram nosso trabalho em todos os sentidos. E, nos bastidores, tivemos a informação de que não se desejava aquela pesquisa”, relata Maria Helena, lembrando, ainda, dos episódios de violência vivenciados em território indígena, como o assassinato dos indigenistas Dom Phillips e Bruno Pereira, em junho daquele ano. “Entendemos que os trabalhadores da saúde indígena estavam claramente inseguros em responder o questionário”, diz. O resultado foi fazer uma “parada estratégica, em proteção aos trabalhadores”: a pesquisa foi interrompida em agosto de 2022, para ser retomada em uma possível mudança de governo – como, de fato, ocorreu.
A intenção era reiniciar o trabalho logo no início do governo Lula, mas outro entrave se observou: a tragédia sanitária dos povos yanomami e a declaração de Emergência em Saúde Pública de Importância Internacional nesse território.
“Agora, estamos retomando com mais força e contando com financiamento que nos permitirá também deslocar equipes para algumas áreas estratégicas, para fazermos registros fotográficos e entrevistas”, destaca Maria Helena. Deverão ser visitadas até dez áreas, no Amazonas, Pará, Mato Grosso, São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro, sendo que nos três estados da região Sudeste estarão incluídos indígenas não aldeados, que vivem nas periferias dos centros urbanos. ‘São indígenas também e devem ter direito a seu atendimento especializado”, observa a pesquisadora.
O questionário deverá circular até por volta de outubro de 2023. Na primeira etapa da pesquisa, realizada em 2022, foram obtidas pouco menos de 2 mil respostas, em um universo de cerca de 16 mil trabalhadores da saúde indígena. “Queremos não só ampliar a quantidade de questionários respondidos, como nos assegurarmos de que conseguiremos uma amostra representativa de todas as regiões, perfis, situações, culturas, para podermos afirmar que a pesquisa representa, de fato, o universo da saúde dos trabalhadores indígenas do país”, explica Maria Helena. Para ela, o resultado da pesquisa deverá mostrar que se trata de trabalhadores “ainda mais invisíveis” do que os pesquisados em estudo anterior pela equipe.
O questionário digital é anônimo e as informações prestadas, sigilosas. A divulgação se dará de forma agregada, evitando-se qualquer identificação, conforme anuncia o termo de consentimento da pesquisa.
Uma primeira seleção de dados preliminares está prevista para divulgação em maio de 2023, em evento que buscará marcar a reaproximação entre os pesquisadores e a Sesai. “É importante que os trabalhadores saibam que a Sesai está conosco”, avalia Maria Helena. Os resultados finais deverão ser divulgados no final do ano. “Vamos produzir conhecimento específico sobre a realidade desses trabalhadores, desvendar um mundo muito invisibilizado. Que os trabalhadores da saúde indígena nos ajudem a preservar os povos originários”.
Acesse o questionário da pesquisa