Maria do Carmo: 'Se queremos um país menos violento, temos que parar de violentar as crianças e as famílias pobres’
A pesquisadora Maria do Carmo Leal, da Escola Nacional de Saúde Pública, uma das coordenadoras do estudo Nascer nas prisões, reafirmou a importância da decisão recente do Supremo Tribunal Federal, que concedeu, em 20 de fevereiro, habeas corpus coletivo em favor de mulheres grávidas, ou mães de crianças de até 12 anos presas sem julgamento, com prazo de 60 dias para seu cumprimento. “O que tenho visto são denúncias que descumprem essa decisão. O cumprimento dessa lei teria um impacto muito positivo na vida dessas mulheres e de suas famílias. Essas mulheres estão em uma posição muito desfavorável na pirâmide social, 80% delas têm, quando são presas, pelo menos, dois ou três filhos, pouca instrução e são muito pobres, sendo, por isso, muito vulneráveis socialmente”, diz a pesquisadora, alertando que o benefício do habeas corpus é essencial para que as famílias dessas mulheres não se desestruturem. “Manter essas mulheres presas é um prejuízo social imenso”, completa.
Leia o comentário a seguir:
“O benefício concedido pelo habeas corpus já havia sido garantido em 2016, por meio de lei, sancionada pela então presidenta Dilma Roussef, que alterava o Código de Processo Penal, para permitir a substituição da prisão preventiva pela domiciliar, quando se tratasse de gestante ou mulher com filho até 12 anos.
Assim, o habeas corpus concedido recentemente pelo STF veio para fazer valer a lei. Mas o que tenho visto em jornais - já que não está sendo feita nenhuma pesquisa sobre isso - são denúncias de mulheres presas com esses requisitos, mas que estão sem ser beneficiadas.
Essas mulheres são simples, a maioria esmagadora delas está presa sem julgamento, por pequenos crimes, respondendo por porte de droga ou por levar droga para o companheiro preso, ou até mesmo por brigas no ambiente onde moram. Grande parte dessas mulheres não oferece nenhum risco à sociedade, são apenas mulheres pobres que, por algum problema, foram parar na prisão.
Acredito que esteja faltando uma atenção maior a essas mulheres, que são muito desvalorizadas, desconsideradas. Elas sofrem muito preconceito e infelizmente não têm qualquer tipo de suporte. O próprio sistema Judiciário poderia fazer essa vigilância, em relação ao cumprimento do habeas corpus, mas o que tenho visto são denúncias do descumprimento dessa decisão do STF. O seu cumprimento teria um impacto muito positivo na vida dessas mulheres e de suas famílias. Essas mulheres estão em uma posição muito desfavorável na pirâmide social, 80% delas têm, quando são presas, pelo menos, dois ou três filhos, pouca instrução e são muito pobres, sendo, por isso, muito vulneráveis socialmente. Desse modo, o benefício dado pela lei é muito importante para que essas mulheres não percam seus filhos e para que não haja a desorganização da família. Manter essas mulheres presas é um prejuízo social imenso.
Se pensamos em diminuir a violência no país e em ter algum bem-estar, a proteção das crianças é essencial, porque elas não cometeram crime algum. Elas perderam suas mães, que estão presas, e, por isso, ficaram entregues quase à própria sorte, já que o estado não cuida das crianças quando perdem a mãe. É importante que a gente reflita sobre o nível de violência que a sociedade impõe a bebês que nascem presos. Se quisermos um país com menos violência, temos que parar de violentar as crianças e as famílias pobres.
Veja o estudo na íntegra aqui
Assista a íntegra do documentario Nascer nas prisões : gestar, nascer e cuidar
Assista abaixo trailer do documentário