‘A Fiocruz nasceu rompendo a barreira entre saúde e economia’, diz Carlos Gadelha
A edição de novembro de 2021 da Revista Abipti, publicação da Associação Brasileira das Instituições de Pesquisa Tecnológica e Inovação, traz entrevista com o pesquisador Carlos Gadelha, coordenador do Centro de Estudos Estratégicos da Fiocruz Antonio Ivo de Carvalho. Na entrevista, Gadelha faz um resgate histórico da relevância do papel da Fiocruz para a saúde pública do país, destacando alguns marcos dessa trajetória institucional e destacando a necessidade de investimento em ciência, tecnologia e inovação como caminho para garantir um desenvolvimento sustentável com equidade.
“A Fiocruz nasceu rompendo a barreira entre saúde e economia, conceito que faz parte da visão original de Oswaldo Cruz”, observa Gadelha, destacando que a saúde pública brasileira nasce com a Fiocruz e que a instituição foi criada em situação semelhante à atual, com epidemias – febre amarela, peste bubônica, varíola – que assolavam o Brasil.
Gadelha lembrou também a gestão do sanitarista Sergio Arouca, “o marco mais contemporâneo da Fiocruz”. À frente da instituição, Arouca presidiu também a histórica 8ª Conferência Nacional de Saúde (em 1986), na qual foram elaboradas as diretrizes de criação do Sistema Único de Saúde (SUS). “A Fiocruz liderou a criação do SUS, que é a maior inovação da América Latina na área da saúde pública. Sergio recuperou o ideário de Oswaldo Cruz, de Carlos Chagas, da autonomia nacional na democracia”, destaca o pesquisador. “O modelo da Fiocruz atual, que tem as unidades de produção, de pesquisa, que fazem controle de qualidade, serviço numa mesma organização, é uma criação da gestão de Sérgio Arouca”, pontua.
A atuação da Fiocruz em meio à pandemia de Covid-19 também foi abordada na entrevista. Conforme aponta o coordenador do CEE-Fiocruz, a Fundação assumiu liderança nacional para o enfrentamento da pandemia, com vacinas e também orientando a população, com base em estudos científicos que comprovaram, por exemplo, a necessidade do uso de máscaras e do distanciamento social na prevenção da doença.
A Fiocruz protagonizou, também, observa Gadelha, a construção do conceito de Complexo Econômico-Industrial da Saúde, a partir de 2002, entendendo desde então, de acordo com o ideário de Sergio Arouca, que “sem base produtiva tecnológica de inovação não teremos SUS”. De acordo com Gadelha, o alerta feito há 20 anos mostra-se realidade. “Ficou claro que sem ciência e sem tecnologia a gente se torna vulnerável e dependente. Não tem capacidade produtiva de vacinas, testes, medicamentos. E agora a gente está alertando para o futuro. Hoje, 90% das patentes em saúde são dominadas apenas por dez países. Isso nos indica as dependências esperadas para o futuro”.
Nesse caminho, o pesquisador alerta também para a necessidade de se dar “um salto para a inovação”, avaliando que a capacidade tecnológica de produzir do passado não atende mais as necessidades do desenvolvimento e do SUS. “Isso é um desafio enorme”, diz. “Em vez de se cortar o orçamento para ciência, tecnologia e inovação, é preciso aumentar em dez vezes. O Brasil hoje tem uma dependência em saúde que chega a 20 bilhões de dólares”, quantifica.
Para Gadelha, é preciso enfrentar o “complexo de vira-lata”, para que o mundo trate o Brasil com respeito. “Vamos cooperar para desenvolver tecnologia aqui, não tratar apenas o Brasil como mercado para consumidor, comprador de produtos acabados”, conclama.
Gadelha aponta, ainda, a relevância da educação no enfrentamento dos desafios da ciência para o futuro, tendo em vista o vazio de profissionais qualificados para atender as demandas que se apresentam. “Estamos fazendo educação para um olhar no retrovisor, e a gente tem que preparar o jovem para lidar com a incerteza, com o futuro, com o erro, com o aprendizado, com o olhar para novo e ao mesmo tempo buscar o saber permanentemente”, propõe. “É o grande desafio da educação contemporânea, e acho que as nossas instituições e a sociedade estão muito atrasadas nesse aspecto”.
Acesse a edição da Revista Abipti e leia a entrevista completa.