Especialistas discutem acesso às tecnologias de diagnóstico e tratamento do câncer no Brasil
O CEE-Podcast conversou com o oncologista e ex-ministro da Saúde Nelson Teich, o cirurgião oncológico e diretor executivo da Fundação do Câncer, Luiz Augusto Maltoni Jr e o médico e pesquisador do Inca, João Viola sobre acesso às tecnologias de diagnóstico e tratamento do câncer no Brasil, após oficina realizada pelo grupo de pesquisa do projeto integrado ‘Doenças Crônicas e Sistemas de Saúde – Futuro das Tecnologias de Diagnóstico e Tratamento do Câncer – FTDTC’, do Centro de Estudos Estratégicos da Fiocruz Antonio Ivo de Carvalho (CEE-Fiocruz), em 27/08/24.
Sob a coordenação do ex-ministro da Saúde José Gomes Temporão e o ex-diretor do Instituto Nacional do Câncer (Inca), Luiz Antonio Santini, ambos pesquisadores associados do CEE, o evento reuniu especialistas e stakeholders para discutir, entre outras questões, o fortalecimento da Política Nacional de Prevenção e Controle do Câncer (PNPCC), a prevenção e a ampliação do acesso a tecnologias de diagnóstico e tratamento do câncer, incluindo reabilitação e cuidados paliativos.
Em sua fala ao blog do CEE, Nelson Teich sublinhou a complexidade da discussão em torno do acesso ao diagnóstico e tratamento do câncer. “O acesso não é apenas a pessoa chegar no lugar. É muito mais. É chegar na hora certa, o lugar a ter condições de tratar, ter um profissional qualificado e oferecer um acompanhamento adequado ao paciente”.
Nelson Teich: É necessário ter uma coordenação de cuidado que permita o acompanhamento do paciente desde a rede de atenção primária até a atenção especializada
O oncologista destacou, ainda, que a inovação em saúde exige profissionais cada vez mais capacitados, mas a gestão da saúde não tem conseguido acompanhar nem a complexidade, nem o custo, nem a inovação.
Embora reconheça a importância da prevenção primária, Nelson Teich ressaltou que, com o envelhecimento da população brasileira, aumenta a necessidade de cuidado e tratamento. E, em sua avaliação, o sistema de saúde não vai dar conta dessa demanda, investindo apenas em prevenção no curto prazo.
Teich participou da construção da Lei 14.758 de 19 de dezembro de 2023, que institui a Política Nacional de Prevenção e Controle do Câncer no SUS, mas entende que não adianta se criar uma lei sem se criar condições para que ela seja cumprida. “Quando se tenta regular alguma coisa que não funciona, a única coisa que se tem é a ineficiência regulada”, afirmou.
Ele falou da importância de se criar condições para o que estiver planejado aconteça e, se não acontecer, os gargalos possam ser corrigidos. “O sistema (de saúde) tem que cuidar das pessoas literalmente”. Em sua avaliação, “o ideal seria que tivesse uma coordenação de cuidado que permitisse o acompanhamento do paciente desde a rede de atenção primária até a atenção especializada".
Em sua exposição, Luiz Augusto apontou a necessidade de identificação dos principais gargalos do acesso às tecnologias de diagnóstico e tratamento do câncer no Brasil, já existentes, para, a partir daí, se pensar em ampliar esse acesso, permitindo, por exemplo, diagnósticos mais precoces. “Precisamos incorporar tecnologias que agreguem resultados”, explicou, enfatizando a importância “do modelo de gestão, e de como podemos alocar e definir recursos financeiros da maneira mais adequada para atender o maior número de pessoas”.
Luiz Augusto: É fundamental identificar os gargalos do diagnóstico e tratamento do câncer no Brasil para tornar o acesso mais equânime
João Viola destacou, por sua vez, que o enfretamento das desigualdades diante de um país continental como o Brasil é uma das questões fundamentais para pensarmos o acesso equânime. “O país é a oitava economia do mundo, mas é um país extremamente desigual. Desigual na distribuição de renda e desigual no acesso da população às várias necessidades básicas, isso inclui a saúde. Portanto, trabalhar o Brasil dentro da sua diversidade é fundamental”.
João Viola: É preciso pensar na complexidade de promover o acesso equânime ao diagnóstico e tratamento do câncer num país ainda tão desigual
Para Viola, temos ainda, associada à questão econômica, o subfinanciamento do nosso sistema público de saúde, que nos desafia “trabalhar junto aos poderes constituídos, principalmente, o legislativo, a fim de dar sustentabilidade ao SUS, e promover mais acessibilidade à população que o utiliza”, avaliou.
Viola acrescentou que, aliado a isso, é preciso considerar a transição populacional pela qual passamos, pois “segundo os dados do Ministério da Saúde, câncer é a segunda causa de mortes no Brasil, e as projeções mostram que o envelhecimento da população, associado a outros fatores, levará possivelmente em 15 a 20 anos, o câncer a ser a primeira causa morte no país”, concluiu.
Além de Nelson Teich, Luiz Augusto Maltoni Jr, João Viola e os coordenadores do grupo de pesquisa José Gomes Temporão e Luiz Antonio Santini, a oficina contou com a participação do secretário executivo do CEE Marco Nascimento; a coordenadora de pesquisa do Observatório de Oncologia do Movimento Todos Juntos Contra o Câncer (TJCC), Nina Melo; a pesquisadora Maria Beatriz Kneipp Dias, do Inca; o oncologista Pedro Henrique de Souza, da Onco Clínicas e Fabio Fedozzi diretor geral da Associação Brasileira de Linfoma e Leucemia (Abrale). Estiveram presentes, ainda, os pesquisadores do CEE, Joyce Schramm, Mirian Cohen e Fernando Bessa.