Carlos Gadelha: Para garantir o SUS universal, país precisa consolidar o complexo industrial da saúde
A pandemia do novo coronavírus provocou uma tensão global nos sistemas nacionais de saúde numa disputa acirrada dos países por insumos no mercado internacional. No Brasil, a crise sanitária escancarou um problema estrutural: a imensa dependência tecnológica e produtiva na área da saúde, responsável entre outras fragilidades, pela importação de 94% dos fármacos. Em entrevista ao blog do CEE-Fiocruz, o economista Carlos Gadelha, coordenador de Ações de Prospecção da Fiocruz, faz uma avaliação sobre as deficiências do complexo industrial da saúde no Brasil diante do enfrentamento do novo coronavírus.
“Essa crise nos atingiria de forma dramática de qualquer forma, mas seríamos muito mais resilientes e capazes de responder com agilidade, como a Fiocruz mostrou ser com os testes para diagnósticos, se tivéssemos capacidade produtiva, industrial e tecnológica”, diz Gadelha.
A força da ciência brasileira em saúde, reconhecida mundialmente, em sua opinião, só pode ser viabilizada em termos de produção em escala se houver um setor produtivo industrial e tecnológico estruturado. Segundo o Gadelha, que coordena o grupo de pesquisa “Desenvolvimento, Inovação e Complexo Econômico-Industrial da Saúde” da Fiocruz, “a nossa lacuna principal não é científica, é a fragilidade de um setor produtivo que se tornou pouco denso do ponto de vista tecnológico até para interagir com o nosso sistema de ciência, tecnologia e inovação”.
Essa situação, explica o pesquisador, é baseada em um sistema econômico que prioriza a aplicação financeira em detrimento ao investimento em inovação e desenvolvimento de tecnologias, e acaba resultando em um estímulo à importação de produtos industriais. Para reverter esse quadro, ele diz que será necessário “um novo projeto de desenvolvimento, apoiado em três pilares: o direito social, a capacidade de produção e tecnológica local e o sistema de ciência e tecnologia”.
Em relação ao futuro, Gadelha sublinha que “nossa necessidade não se esgota no coronavírus”. A garantia de autonomia do funcionamento do SUS depende de uma base produtiva tecnológica e científica sólida. “Não conseguiremos atender 210 milhões de brasileiros, garantindo-lhes o direito à saúde, se não tivermos capacidade de produção desse sistema industrial na área da saúde”, conclui.
Para o pesquisador, é importante que o Brasil entre de cabeça na 4ª revolução tecnológica industrial que envolve entre outras ferramentas instrumentos que irão permitir melhorar nossa capacidade preditiva para a vigilância epidemiológica.